Ano: 2013
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Busque Amor novas artes, novo engenho, para matar-me
Busque Amor novas artes, novo engenho,para matar-me, e novas esquivanças;que não pode tirar-me as esperanças,que mal me tirará o que eu não tenho. Olhai de que esperanças me mantenho!Vede que perigosas seguranças!Que não temo contrastes nem mudanças,andando em bravo mar, perdido o lenho. Mas, conquanto não pode haver desgostoonde esperança falta, lá me escondeAmor um…
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Quem diz que Amor é falso (Luís Vaz de Camões)
Quem diz que Amor é falso ou enganoso,ligeiro, ingrato, vão, desconhecido,sem falta lhe terá bem merecidoque lhe seja cruel ou rigoroso. Amor é brando, é doce e é piadoso.Quem o contrário diz não seja crido;seja por cego e apaixonado tido,e aos homens, e inda aos deuses, odioso. Se males faz Amor, em mi se veem;em…
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Romance VII ou do negro das Catas (Cecília Meireles)
Do negro nas catas Já se ouve cantar o negro,mas inda vem longe o dia.Será pela estrela d’alva,com seus raios de alegria?Será por algum diamantea arder, na aurora tão fria? Já se ouve cantar o negro,pela agreste imensidão.Seus donos estão dormindo:quem sabe o que sonharão!Mas os feitores espiam,de olhos pregados no chão. Já se ouve…
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Herança (Cecília Meireles)
Eu vim de infinitos caminhos, e os meus sonhos choveram lúcido prantopelo chão. Quando é que frutifica, nos caminhos infinitos, essa vida, que era tão viva, tão fecunda, porque vinha de um coração? E os que vierem depois, pelos caminhos infinitos, do pranto que caiu dos meus olhos passados, que experiência, ou consolo, ou prêmio…
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E o meu caminho começa …
Não perguntavam por mim,mas deram por minha falta.Na trama da minha ausência,inventaram tela falsa. Como eu andava tão longe,numa aventura tão larga,entregue à metamorfosedo tempo fluido das águas;como descera sozinhoos degraus da espuma clara,e o meu corpo era silêncioe era mistério minha alma –– cantou-se a fábula incerta,segunda a linguagem da harpa:mas a música é…
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Última Página (Olavo Bilac)
Primavera. Um sorriso aberto em tudo. Os ramosNuma palpitação de flores e de ninhos.Doirava o sol de outubro a areia dos caminhos(Lembras-te, Rosa?) e ao sol de outubro nos amamos. Verão. (Lembras-te, Dulce?) À beira-mar, sozinhos.Tentou-nos o pecado: olhaste-me… e pecamos;E o outono desfolhava os roseirais vizinhos,Ó Laura, a vez primeira em que nos abraçamos……
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Dualismo (Olavo Bilac)
Olavo Bilac Não és bom, nem és mau: és triste e humano…Vives ansiando, em maldições e preces,Como se, a arder, no coração tivessesO tumulto e o clamor de um largo oceano. Pobre, no bem como no mal, padeces;E, rolando num vórtice vesano,Oscilas entre a crença e o desengano,Entre esperanças e desinteresses. Capaz de horrores e…
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Poema (Mario Quintana)
Oh! aquele menininho que dizia“Fessora, eu posso ir lá fora?”Mas apenas ficava um momentoBebendo o vento azul…Agora não preciso pedir licença a ninguém.Mesmo porque não existe paisagem lá fora:Somente cimento.O vento não mais me fareja a face como um cão[amigo…Mas o azul irreversível persiste em meus olhos. Mais poemas de Mário Quintana .. O poeta…
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PÁGINA VAZIA (Euclides da Cunha)
Quem volta da região assustadora De onde eu venho, revendo, inda na mente, Muitas cenas do drama comovente De guerra despiedada e aterradora. Certo não pode ter uma sonora Estrofe ou canto ou ditirambo ardente Que possa figurar dignamente Em vosso álbum gentil, minha senhora. E quando, com fidalga gentileza Cedestes-me esta página, a nobreza…
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Sete anos de pastor Jacob servia
William Dyce – O encontro de Jacob e Raquel Sete anos de pastor Jacob serviaLabão, pai de Raquel, serrana bela;Mas não servia ao pai, servia a ela,E a ela só por prémio pretendia. Os dias, na esperança de um só dia,Passava, contentando-se com vê-la;Porém o pai, usando de cautela,Em lugar de Raquel lhe dava Lia.…